terça-feira, 30 de setembro de 2014

Educar por Inteiro - Cap. 5: A Atenção Concentrada a Partir do Primeiro Ano


Capítulo 5
A Atenção Concentrada a Partir do Primeiro Ano
Entre Um e Dois Anos
Neste período, a criança estará explorando o mundo de forma ativa, desenvolvendo um senso cada vez mais forte de quem ela é1.
Nesta fase, a atenção concentrada dos pais deve ajudar a criança a entender como o mundo funciona, suas leis de causa e efeito, e a resolver problemas sociais complexos, como respeitar limites e fazer solicitações adequadas.
Eis algumas sugestões de como melhor ajudar seu filho nessa etapa:
a.     Mostre verdadeiro interesse, apreciação e orgulho pelas coisas que ele faz. Não responda às suas solicitações de atenção com enfado ou irritação.
b.     Divirta-se enquanto se comporta tolamente sob o estímulo de seu filho. Deixe-o provocá-lo com sons bobos, ou gestos incoerentes e entre na dele, divertindo-se enquanto também faz movimentos ou sons engraçados. Você estará dando um importante reforço à sua criatividade e individualidade.
c.     Deixe-o ser o chefe da brincadeira, e siga suas instruções.
d.     Ajude-o a expressar todas as suas emoções. Não o critique por estar com raiva ou triste. Mostre que é normal sentir-se assim de vez em quando, e que isso vai passar. Reconheça as emoções, mesmo as negativas, acolhendo-as graciosamente, mas não permita que sejam acompanhadas de agressão ou violência (“Você está muito brava com a mamãe, não é mesmo?!? É porque eu não deixei você atirar a boneca pela janela? Entendo que você ficou brava. Isso é normal. Mas não quero mesmo que você faça mais isso.”)
e.     Ajude seu filho a respeitar limites. Demonstre sua seriedade através de linguagem não-verbal coerente (olhar sério, dedo em riste, voz firme. Mas não grite ou xingue). A criança necessita de limites para organizar seu comportamento e se sentir mais segura.
f.      Estimule-o a brincar com amigos da mesma idade e a interagir construtivamente com eles.
g.     Continue estimulando-o a se comunicar intensamente com você, mostrando-se atento e interessado em suas atividades, conquistas e emoções. Esteja genuinamente envolvido nas coisas que despertam o interesse de seu filho.
h.     Desafie seu filho a comunicar o que ele deseja através de gestos e comportamentos, ao invés de simplesmente adivinhar suas vontades para fazer as coisas andarem mais rápido.
i.      Não o rotule como bom ou mau. Reconheça suas características básicas, como o que lhe dá prazer ou ira, e procure respeitá-las.
j.      Estimule-o a imitar você. Divirta-se com isso. Explore esses momentos de forma lúdica e agradável. Jogue o jogo da imitação, revezando com seu filho.
k.     Desafie seu filho a resolver problemas de maneira lúdica, como escondendo seu brinquedo na prateleira e pedindo a ele que o encontre, ou a dizer alguma palavra quando quiser algo, como “água”, ou “por favor”.
Exercícios:
1. Quais os principais objetivos da atenção concentrada dos pais nesta fase entre o primeiro e o segundo ano de idade da criança?
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2. Como melhor ensinar seu filho a respeitar limites? Dê exemplos de comportamentos dos pais que ajudam e que atrapalham neste aprendizado.
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3. Em vez de rotular a criança, o que os pais devem fazer?
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4. Encenem em grupo maneiras diferentes de estimular a criança a expressar suas emoções e vontades.
Entre Dois Anos e Dois Anos e Meio
Neste período, a criança demonstrará marcante capacidade de criar símbolos e idéias. Também afirmará sua personalidade através de negativas ou antagonismos com os pais. É a fase do não, e os pais precisam encarar esta atitude de forma positiva, pois é sinal de que a criança está criando um espaço próprio de identidade e vontade. Ela estará sendo tanto uma construtora de imagens mentais quanto de comportamentos.
A atenção concentrada dos pais deve, nesta etapa, ajudar o filho a lidar com a criatividade à medida que explora idéias e conceitos cada vez mais complexos. Assim aprenderá a interpretar o mundo à sua volta e o seu papel como indivíduo dentro dele.
A principal atividade lúdica e pedagógica com crianças desta idade é o jogo de faz-de-conta brincado no chão, por exemplo, gato e rato, mocinho e bandido, cavalo e cavaleiro, etc. Isso inclui a imitação de situações diárias, como a mamãe fazendo comida, ou o papai cuidando do carro, etc. Panelinhas, carrinhos, casinhas, e outros brinquedos que imitem objetos do dia-a-dia, assim como bonecos e fantoches, também servem para esse tipo de brincadeira.
a.     Reserve 20 a 30 minutos de seus momentos diários mais relaxados para brincar com seu filho neste mundo de faz-de-conta.
b.     Dialogue intensamente com a criança, explorando sua capacidade de responder. Jogue o jogo do diálogo. Se a criança diz “água”, em vez de simplesmente dar-lhe água, pergunte de modo provocativo: “quem quer água?”, depois, “e onde está a água?”, “onde coloco a água?”, etc.
A Partir dos Dois Anos e Meio
            A partir dos dois anos e meio, a criança estará cada vez mais formando conexões lógicas entre as coisas, idéias e fatos da vida.
            Os pais devem usar sua atenção concentrada para estimulá-las no desenvolvimento do raciocínio lógico, dos padrões de comportamento moral, e das leis de causa e conseqüência.
a.     Desafie seu filho a explicar quem, o que, por que, como, quando e onde, através de perguntas inseridas no contexto das coisas diárias. “Quem vai chegar daqui a pouco do trabalho?”, “Por que a gente deve lavar as mãos antes de comer?”, “Onde devemos colocar o lixo?”, etc.
b.     Brinque de faz-de-conta durante 20 a 30 minutos diários, com histórias mais elaboradas, como visitar o vovô, ir ao supermercado, receber visitas, etc.
c.     Estimule conversas reflexivas e desfrute delas. Encoraje a criança a relatar detalhes, em vez de simplesmente dizer sim ou não.
d.     Explique o motivo pelo qual você faz determinadas solicitações, em vez de simplesmente emitir ordens: “Filho, primeiro o almoço, depois o sorvete! Para você crescer como o papai precisa de arroz, feijão, salada e carne. Sorvete é só para enfeitar barriga!”, em vez de: “Larga já este sorvete! ... Já mandei largar!”.
e.     Tenha prazer em conversas demoradas a respeito de tudo, mostrando interesse pelas visões de seu filho e estimulando-o a emitir opiniões e fazer julgamentos.
f.      Não resolva os problemas para seus filhos. Dê-lhes tempo para resolvê-los por si só, sempre que possível.
g.     Tenha prazer em contar histórias para a criança. Repita-as tantas vezes quanto ela desejar!
h.     Encoraje seu filho a identificar e expressar seus sentimentos em relação às coisas, tanto em jogos de faz-de-conta quanto em conversas sobre coisas do dia-a-dia.
i.      Exponha seu filho a uma rica variedade de experiências e atividades, como passear, fazer compras, andar de bicicleta, montar quebra-cabeças, escutar música, dançar, etc.
j.      Ajude-o a entender cada vez melhor conceitos como tempo, quantidade, seqüência, causalidade, etc., e a lidar com eles no dia-a-dia. Por exemplo: “Daqui a quinze minutos, nós vamos sair. Quinze minutos é quando o ponteiro grande chegar aqui em cima, no 12!”; “Filho, por favor, apanha na prateleira, para a mamãe, duas latinhas amarelas de milho.”; “Filha, por que você acha que o gatinho está bebendo água?”, etc...
Exercícios:
1. Dê alguns exemplos de jogos de faz-de-conta que podem ser brincados com a criança. Teatralize com seus colegas alguns deles.
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2. Crie alguns exemplos adicionais de perguntas que os pais podem fazer para os filhos nesta fase, para estimular sua capacidade de responder e raciocinar.
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3. Como você pode criar o hábito de explicar para seu filho por que algo deve ou não deve ser feito, em vez de simplesmente dar ordens?
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4. Encenem em grupo uma história faz-de-conta mais complexa, baseada na realidade, do tipo “ir ao supermercado”, “visitar a vovó”, etc.
5. Escolha e escreva abaixo, para cada faixa etária, três ações de atenção concentrada que você considera importante ou que mais chamou sua atenção (de acordo com o grau de importância):
entre um e dois anos de idade:  _______________________________________________________
entre dois anos e dois anos e meio: ___________________________________________________
a partir de dois anos e meio: _________________________________________________________
A Atenção Concentrada até a Puberdade
            Uma vez que tenhamos enfrentado os três primeiros meses e os três primeiros anos do desenvolvimento de nossos filhos, os demais anos serão basicamente uma expansão das formas de interação construídas até aqui.
            Eis algumas dicas que ajudarão a perceber como funcionam as coisas neste período:
a.     Lembre-se que os momentos de atenção concentrada são aqueles que você dedica a cada um de seus filhos separadamente. A atenção concentrada de cada um dos pais é uma necessidade vital dos filhos.
b.     Os momentos de atenção concentrada não vêm por mágica. Agende e reserve tempo para estar a sós com cada um dos filhos, regularmente.
c.     Olhe seu filho nos olhos e toque nele com carinho nesses momentos. (Lembre-se da regra básica: precisa ser confortável!)
d.     Planeje ocasiões que possam se tornar momentos de atenção concentrada (um lanche na ida ao médico, ajudar numa tarefa doméstica, assistir um filme, etc.). Esteja atento para transformar momentos corriqueiros da vida em momentos especiais.
e.     A atitude é o que mais importa: uma piscadinha de olho para o filho e um convite para dar uma passadinha na lanchonete para fazer um lanchinho “só nós dois!”, pode representar algo imenso em termos emocionais. Uma avó dava para o neto seus comprimidos de remédio para que ele chupasse a casquinha colorida e doce, antes de ela ingeri-los. Um pai revezava o nome das filhas quando contava a história dos três porquinhos. O porquinho da casa de tijolos, que o lobo não conseguia destruir, tinha o nome da homenageada. Seja imaginativo! Divirta-se! O importante é criar um espírito de cumplicidade com cada um dos filhos, tornando-o especial em certos  momentos.
f.      Esteja atento aos momentos passageiros e às oportunidades que a vida oferece para a atenção concentrada: prestar atenção ao relato de uma vitória do filho, o momento de ir para a cama (contando uma história deitadinho ao seu lado. Revezando de cama, no caso de vários filhos!), etc.
g.     Crianças menos exigentes tendem a ser as mais negligenciadas pela atenção dos pais. Quem não chora não mama, tende a ser uma regra em lares com muitos irmãos. Por isso, os pais devem ficar atentos para não atender somente a criança mais solicitadora (em geral, os meninos), e serem cuidadosos para distribuir a todos uma parcela considerável e justa de sua atenção. Nessas famílias numerosas há necessidade de alternar a atenção aos vários filhos, e, de forma consciente e natural, saber distribuir seu tempo, pois os filhos do meio tendem a se sentir mais prejudicados pelo excesso de atenção dada ao primogênito e ao caçula.
h.     Os pais devem ficar atentos para não roubar a atenção de qualidade dos demais filhos por ocasião de dificuldades de um deles, como doenças ou dificuldades na escola. A criança que se sente privilegiada em função de seus problemas, tende a privilegiar seus problemas para manter os privilégios! Os demais tendem a sofrer uma angústia muda e difícil, pois ficam ressentidos, em função da falta de atenção paterna, e sentem-se culpados deste ressentimento, em função da doença do irmão. Por isso, é importante dispensar atenção à criança necessitada, mas não numa dimensão que a torne o centro do universo familiar e um buraco-negro que suga todas as atenções familiares.
i.      É importante dar-se conta de que a necessidade de atenção concentrada aumenta com a idade. À medida que a criança começa a compartilhar de uma parcela cada vez maior do mundo e do entendimento dos pais, sua necessidade de tempo de qualidade com cada um deles aumenta. Muitos pais cometem o equívoco de ir deixando seus filhos mais e mais soltos, à medida que se mostram mais independentes, mas isso é um erro. Eles precisam de momentos regulares de diálogo, lazer e interação com os pais.
j.      Um equívoco comum de pais que não dedicam seu tempo a seus filhos é enchê-los de presentes e mimos como substitutos da atenção. Isso geralmente é causado por sentimentos de culpa, ou para compensar o que o pai não teve na sua própria infância. O que os filhos mais precisam dos pais não custa nada, mas exige definição de prioridades.
k.     Os pais precisam definir sinceramente onde estão seu filhos na sua lista de prioridades. Isso é essencial para a atribuição de tempo a ser despendido com eles. Nenhum de nós jamais terá tempo suficiente para atender a todas as demandas da vida. O tempo é nosso bem mais precioso, mais escasso e mais passageiro. Assim, precisamos aprender a reservar tempo para as coisas importantes, não permitindo que ele seja totalmente consumido pelas coisas urgentes. Por exemplo, se estamos brincando com nossos filhos e o telefone toca, deveríamos voltar a dar atenção ao filho depois da conversa; ou desconsiderar o telefone e seguir com a brincadeira. Se for algo muito sério, certamente voltarão a chamar mais tarde.
l.      Muitos problemas de comportamento na meninice podem ser facilmente contornados com a atenção concentrada. Passar momentos de lazer prazerosos com cada um dos filhos é de um imenso valor terapêutico para distúrbios de comportamento, que muitas vezes têm sua origem no sentimento de rejeição nutrido pela criança.
m.   Embora a TV possa parecer uma grande bênção como babá substituta, o fato é que ela não poderá jamais substituir a interação amorosa com os pais. Lembre-se que a TV tem um botão de liga-desliga e de mudança de canal! Os filhos acatam ordens coerentes e podem ser educados a não depender da TV como maior companhia nos momentos de lazer. Uma babá de verdade, da mesma forma, não deveria ser empregada como substituta da mãe, apenas para facilitar a vida dela. Nestes casos, não é de estranhar que as crianças tenham muito mais estima pelas babás do que pelos pais, o que, geralmente, complica a situação pelas manifestações de ciúmes e cobrança emocional que eles transmitem.
n.     A atenção concentrada não depende apenas de momentos de lazer. Realizar tarefas domésticas de ajuda aos pais pode ser uma maravilhosa ocasião para desfrutar desta relação íntima e fecunda. Ajudar a mãe a fazer um bolo, ou a limpar a cozinha, ou o pai a limpar a garagem, ou reparar a casa ou o carro, podem ser momentos preciosos de atenção e companheirismo. É fundamental, entretanto, que os pais se mantenham animados, de bom-humor, pacientes e calmos durante estes momentos.
o.     Outra coisa a ser evitada é dar atenção concentrada ao filho quando você não está nem um pouco disposto a isso, por sentimento de culpa, ou por achar que “se isso é tão importante, tenho que dar de qualquer forma”. Tais momentos geralmente viram uma experiência frustrante para pais e filhos. O que tende a acontecer é: 1) o filho logo perceber que o pai está ali de má vontade, e interpretar isso como uma demonstração de rejeição; 2) o pai, por estar contrariado, perder a paciência facilmente e brigar com a criança, gritar com ela, ou mesmo destruir seus brinquedos. Nestes casos, é muito melhor ter uma conversa franca com o filho, explicando que não está em condições de brincar, e ficar abraçadinhos vendo TV.

Exercícios:
1.     Como deveriam ser os momentos de atenção concentrada?
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2.     Em que momentos podemos praticar a atenção concentrada?
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3.     Analise a seguinte afirmação: “A necessidade de atenção concentrada aumenta com a idade”.
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4.     Por que é necessário os pais estabelecerem prioridades no seu uso do tempo?
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5.     Nesta última semana, quais situações você considerou como importantes e como urgentes em sua vida. Em quais momentos os assuntos importantes não foram invadidos pelos urgentes?
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6.     Relate fatos da vida real que comprove a seguinte afirmação: “Crianças menos exigentes tendem a ser as mais desatendidas pela atenção dos pais”.
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“Maria e João Paulo tiveram filhas gêmeas idênticas e tentaram tratá-las tão igual, que até os nomes eram semelhantes: Luciana e Luciene. As meninas eram verdadeiras gracinhas. Usavam roupas com modelos iguais, ora de cor diferente, ora da mesma cor. Eram tratadas igualmente. O presente de uma era o presente da outra. O carinho dedicado a uma era o mesmo dedicado à outra. Só passeavam juntas com Maria e esporadicamente a família saía para programas diferentes. Tudo ia muito bem, até que Luciene de risonha, tornou-se triste, começou a regredir nos estudos e passou a agredir seus pais”.
Baseado na história acima discuta com seu grupo:
7.     Se você fosse pai ou mãe de gêmeos daria esse mesmo tratamento que os pais citados?
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8.     Reescreva esta história tomando como base a atenção concentrada discutida neste módulo.
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Notas e Bibliografia:
1.     A maioria das atitudes e atividades sugeridas aqui e nos tópicos seguintes provêm das pesquisas lideradas pelo Dr. Stanley Greenspan. Vide Greenspan, Stanley. Filhos Emocionalmente Saudáveis, Íntegros, Felizes, Inteligentes. Tradução de Sérgio Teixeira. Rio de Janeiro: Campus, 2000.

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